28 de novembro de 2009

SOBRE GATOS, GENTE E SAUDADE

Um miado infantil de gato. Outro miado insistente se aproximando. Outro e mais outro e daí a pouco saio do lugar pra ver o movimento. Eram três. Gatinhos de uns dois ou três meses, provavelmente morando lá. Nada demais se não estivéssemos num cemitério.

Os gatos têm costumes interessantes. Eles roçam, se esfregam literalmente em nossas pernas quando querem um afago, totalmente domesticados parecem já nascer com o código genético totalmente redefinido com a perda total de sua original ferocidade felina.

Nada demais se não estivéssemos num cemitério assistindo a ‘seo’ Ciço de Camelo colocar os últimos bocados de massame nos tijolos que fechariam em definitivo a urna em que Dona Beatriz ficaria definitivamente aprisionada. Pode parecer “coisa do além”, mas foi exatamente assim. Logo ali e logo com ela que era apaixonada por gatos. Cinco ou seis testemunhas, Vinícius com minha lanterna inocentemente alumiando alternadamente a carroça de onde o coveiro tirava o massame e a parede do túmulo onde titia estava sendo sepultada. Era noite no mesmo cemitério onde já fiz até serenata em véspera de finados.

A vida de Dona Beatriz foi cercada por gatos. Minha infância em sua casa foi cercada por gatos. Um angorá, um mourisco, um amarelo... sempre os gatos fazendo-lhe companhia. Até que Mustafá, o seu último preferido se foi em definitivo e ela perdeu o gosto por criar gatos. Mantinha a sua última foto, feita pelo celular de Tia Zorilda, em um porta-retratos por sobre a base de sua estante, bem perto da TV por onde ela via o mundo.

Em sua temporada de mais de 15 anos entre a cadeira de rodas e a cama, guardando e domesticando suas dores a cada segundo, Titia olhava o mundo de uma forma interessante. Ela chamava de “minhas alegrias” suas dores atrozes de uma artrite reumatóide que lhe tirara quase todos os movimentos e sua capacidade de manipular objetos.

Quinze anos e mais um pouco de um quase martírio. Um sorriso permanente nos lábios, uma charada pronta pra qualquer visitante, uma anedota na ponta da língua pros mais íntimos, uma história do passado pros familiares ou amigos, uma lembrança doce de sua memória prodigiosa, uma palavra de conforto pra quem a visitasse cheio de lamúrias, pensando que iria confortar uma doente e saía de lá confortado.

Teve em Rosani Freire, Cornélio e filhos a família que não tinha ao seu lado. Teve em Lúcia, sua auxiliar e “enfermeira”, a filha que nunca teve e, como dizem, o anjo da guarda que a protegeu, a carregou literalmente nos braços entre a cama, a cadeira de rodas, o banheiro, alguma novena ou visita especial e assim foi sua vida nos últimos tempos.

Se alguém lamentava pelo fato de estar ali há tanto tempo ela respondia: “e o filho de Heleno que nunca soube o que é andar? Eu ainda andei e fiz tudo sozinha até os 55 anos”. Sua coleção de chaveiros na parede, seus livros, seus discos, sua inquebrantável fé, sua prontidão pra ajudar alguém que precisasse de uma palavra de conforto, sua disposição para a vida.

Há pouco mais de três meses fez uma cirurgia em um olho e me disse: “se eu perder a visão completamente não fica quase nada. Então, se eu puder ver já terei mais motivos pra me alegrar um pouco". E assim foi ao Dr. Sabino Rolim pra “arrumar” seu olho direito com a cirurgia de catarata enquanto o esquerdo dava mostras de não poder mais ser recuperado.

“Decolores! Decolores é a primavera florindo caminhos... Decolores! Decolores são todas as flores são os passarinhos!” É a sua cara guiando o grupo de jovens Decolores em Juazeirinho lá pelos anos 70, junto com Dona Madalena e Rosinha Zelo. Ainda tentei entoar em sua despedida, depois de uma provocação de Verônica ao lado de Zé Martins, mas a voz embargou e um arrepio me impediu. Encabulei!

Uma das maiores e melhores lições de vida que já pude receber. Setenta e Cinco anos de alegria e dedicação à vida. Verdadeira celebração.

Os acordes que hoje consigo ‘impor’ ao piano são resultado do que aprendi com ela na igreja de Juazeirinho por volta de 1977, entre meus 15 e 16, quando resolveu passar uma temporada em São Paulo e eu fui o escolhido para sucedê-la na Sarafina. Ensinou-me a escala natural de tons maiores e menores e lá fui eu dar conta de acompanhar todas as missas dali em diante. Descobri que sou do tempo de Sarafina. Pra quem não sabe, um órgão de fole de pedais, alemão (o da igreja de Juazeirinho deixaram ser literalmente comido pelos cupins, apesar de minha insistência, à época, em trocá-lo por um eletrônico com o objetivo de recuperá-lo), que recebia o nome de Harmônio, muito comum em igrejas lá pelos tempos de antigamente.

Além de acompanhar as missas eu pegava as chaves da igreja na casa de Dona Nevinha de Chico Antero e treinava algumas tardes aquilo que seria tocado no domingo. De quebra aproveitava pra ‘tirar’ algumas canções de Padre Zezinho e, sem medo de pecar, aproveitando a maravilhosa acústica da igreja, arriscava algumas de Roberto Carlos. Sozinho... Arrepiante! Não havia pecado! Tentava transpor o que sabia ao violão pro Harmônio.

Aprendi muita coisa com Titia. Uma delas foi a não desistir nunca.

Na estrada de volta pra Campina, com a mesma melancolia de outras duas viagens que já fiz neste semestre quando fui me despedir de Dona Neide, minha Mãe, e de Iuri, meu sobrinho, ‘viajei’ junto com ela nas belas histórias do passado, como falava com Ivam Freire no Bar de George há poucos dias enquanto degustava uma deliciosa rabada: era uma figura fenomenal.

Os gatos, que foram sua companhia predileta, depois das pessoas, marcaram presença em seu último adeus. Com poucas testemunhas, mas estavam lá como que para agradecer pelo seu carinho com os seus.

Coincidências? Se há algo de sagrado nisto, de místico, de misterioso, de secreto... só quem já partiu poderia saber. Como não vai contar... fica o registro! Fica a minha saudade... doce saudade...

26 de novembro de 2009

SOBRE ACEROLAS, MAMÕES E A VIDA


Colhendo acerolas aos montes sinto uma sensação gostosa de realização. Algo assim tão simples como tomar um copo d'água da minha quartinha, fria, com gostinho de barro e de infância. Olho pra Pitangueira que está crescendo e sonho com suas azedas frutinhas e até arrisco pensar num licor especial que prepararei pra distribuir com amigos.

Colhendo mamões lindos, amadurecidos no pé e tão aguados sinto uma pontinha de frustração e outra de alegria, ao tempo em que faço uma constatação quase fria como a água da quartinha de barro: a vida nem sempre é doce. Aliás, tão poucas vezes a vida é doce que mais parece esse mamão que resolvo comer, mesmo com seu sabor de quase nada, como se todo o açúcar do mundo tivesse se escondido na hora de passar por aquele Mamoeiro.

A questão é que tanto o pé de acerola quanto o de mamão me foram presenteados por Dona Neide, minha mãe. Com sua mania de produzir mudas e sair presenteando me fez cativo de tal costume. Tenho até algumas de graviola e atemóia que consegui produzir em casa e espero que virem frondosas fruteiras e deem bons prazeres a quem as adotar.

Assim como as maravilhosas acerolas gigantes e de macia polpa me lembram as coisas boas e doces, as maravilhosas reminiscências de minha mãezinha e sua alegria motivada por coisas tão simples e pequenas, o mamão aguado também me fazem lembrar o aguado da vida e sua via crucis de quase 25 anos entre médicos e hospitais lutando por seu bem mais precioso, a própria vida.

Hoje vejo com certa tranquilidade que, pra ela, havia chegado seu tempo de "desistir" de lutar contra algo inexorável. Afinal, somos todos assim! E como na vida há tempo pra tudo: pra escolher sementes, pra semear, pra regar, pra podar, pra colher... há o tempo de completude de ciclos, essencialmente de vida, que se completam e se reiniciam com a morte. Ou seja, deixamos de ser o que somos pra nos transformarmos em outras coisas. E olhe que falo apenas de física. Assim como tudo o mais estamos o tempo todo nascendo, morrendo, terminando, começando e recomeçando...

Por hoje, morro nas coisas que deixei de fazer, renasço nas coisas que fiz durante o dia, nos amigos (de sempre) que abracei, no cheiros que senti, nas idéias que plantei, nos sonhos que alimentei, naquilo que sempre fui e estou sendo, diferente sempre e parecido como se não fosse.

Vai entender...

24 de novembro de 2009

AGRADECIMENTO E DESCULPAS

Eu, com minha já tradicional incompetência para autopromoção, não tive a noção exata do que iria fazer e somente depois percebi que bem que poderia ter feito uma divulgação do show lá no Picanha 200, na quinta-feira passada. Fica o meu pedido de desculpas aos que deixaram de ir porque não souberam. Valeu, Débhora.

Ao mesmo tempo meu agradecimento pelas palavras de carinho, o apoio recebido e, claro, os elogios pelo show. "(...) é se guardar um rio perdido / E não encontra o mar..." Pois é assim esse meu amor escondido. às vezes fico achando que quando canto deveria gritar pra todo mundo que vou cantar, que estou feliz, que essa é a caoisa mais maravilhosa do mundo, mas sempre fico numa espécie de quase anonimato, de fato, como se fosse um "amor escondido".

Meu abraço pra vocês. Volto com novidades.

21 de novembro de 2009

RAIMUNDO FAGNER ESPECIAL


Arrisco afirmar que pelo menos uma canção de Fagner (cantada por ele) está impregnada na memória de cada brasileiro, principalmente nordestino, na faixa dos trinta em diante. Isso sem querer isolar outras pessoas em idade inferior.

Quem não estava lá precisava ver a reação de um grupo de uns vinte jovens, entre rapazes e moças na faixa dos 17 a 20 e poucos anos, no Picanha 200 na última quinta-feira, dia 19 de novembro, quando começei a entoar, depois daquele tradicional solo de contrabaixo: "O aço dos meus olhos / E o fel das minhas palavras / Acalmaram meu silêncio / Mas deixaram suas marcas (...) Ai, coração Alado..." (Gracco & Caio Silva). É impressionante!

Em primeiro lugar a longevidade de Fagner como intérprete, com uma voz bem mais apurada que nos primeiros anos de carreira e, da mesma forma, um compositor que não parou de produzir belas canções, sempre em parceria com contemporâneos e novos compositores. E ainda um sujeito que, sem ser caracterizado como um "artista regional", nunca deixou de cantar suas raízes musicais.

Pois bem! Recebi um desafio de fazer um especial com canções de Fagner (que ficaram marcadas em sua interpretação) no Restaurante Picanha 200 e comecei com um exercício de memória com um caderno aberto. Qual não foi minha surpresa quando a lista chegou a 32 músicas, sendo que destas apenas duas eu não tinha a letra e acompanhamento completamente memorizados. Resultado: entre o dia que comecei a lista e o último ensaio já havia chegado (à memória) mais cinco canções.

Tive que "sacrificar" algumas, pois não cabiam todas na proposta de show.

Pra mim foi uma noite memorável. Muito amigos, casa quase lotada em plena quinta feira, apresentação iniciada quase pontualmente na hora prevista, um acompanhamento muito bacana de Alexandre Couto (violão aço, gaita e vocais), Waldenor Fonseca (contrabaixo e violão) e Sandro Dupan (percussão e efeitos). Ainda a participação especial de Dimas Xavier (triângulo/block) na hora do baião.

Recepção maravilhosa, uma viagem fantástica pelo cancioneiro de Raimundo Fagner, uma mexida no baú da memória e dos sentimentos de muita gente (inclusive do cantor), muitos cantando e acompanhando quase todas as músicas... foi tudo de bom.

Lembrei de uma fita cassete que gravei e dei como presente, lá atrás, em 1980 quando eu contava apenas quatro anos que aprendia a tocar e cantar. Estava lá: "Eu sei qu existe por aí / Uma andorinha solta / Procurando um verão / Que se perdeu no tempo (...) É que meu coração de homem / Voa alto como um pássaro" (Ave Coração - Clodo & Zeca Bahia).

Velhos tempos... belos dias que se renovam sempre que pego o violão e começo a entoar uma canção...

O bom do show é que foi pura diversão pra mim, pura viagem divertida e prazerosa, como em homenagem a um cara que musicalmente fez a cabeça de uma geração e continua por aí "dando suas cacetadas", com CD novo e novas canções, novos parceiros, novas idéias...

Viva, Raimundo Fagner!

16 de novembro de 2009

REMINISCÊNCIAS DE UM BEBÊ QUE QUASE NÃO CHEGA LÁ

Mil Novecentos e Sessenta e Dois.Mais ou menos por essas horas do dia (manhã cedo) ele já dava sinais de que queria sair daquela bolsa aconchegante. Mesmo estando tão bom ali dentro havia chegado a sua hora de provar das agruras e maravilhas do mundo, fora daquele conforto razoavelmente seguro, mesmo com a nutrição deficitária.

Demorou, mas lá por volta das 11 da noite ele deu o ar de sua graça. Dona Maria Hilda foi a responsável por "pegá-lo" e em meio ao tradicional corre-corre de uma maternidade caseira, na Rua Getúlio Vargas em Juazeirinho, o bruguelo veio ao mundo.

Oito meses depois uma infecção intestinal o ameaçou de tal maneira que a mãe, contariando todos os conselhos familiares, arranjou o dinheiro da passagem e pegou um ônibus da Empresa Viação Batalhão e cedinho se mandou pra Campina.

- Veja só os olhinhos desse menino que já estão uma nata só. Já é um anjinho!
- Eu trago ele pra casa num caixão, se for preciso, mas não vou deixá-lo morrer aqui, à míngua!

A saga continua já em Campina. Bairro de Monte Castelo, Rua Paraná, casa dos irmãos e irmãs, uma farmácia perto e um farmacêutico famoso no bairro: Mamede Moisés Raia, nome de uma das princípais ruas do bairro hoje. Uma semana depois e o retorno de Dona Neide pra Juazeirinho (Obrigado!) com o menino são e salvo... ao menos daquela.

Não teve papeira, sarampo e outras coisas do gênero, salvo uma "bixiga" que não deixou marcas. Sobreviveu a todas as farras e porres da juventude e passou por quatro acidentes automobilísticos, nenhum de graves consequências.

Passados os anos, um pouco de sobrepeso que não chega a comprometer, umas avarais na coluna vertebral, uma memória levemente comprometida pelas noites mal dormidas e o estresse das atividades múltiplas, mas nenhum medicamento de uso contínuo, a não ser o que ajudou a restaurar a memória ou parte dela. Segundo diz o cardiologista, o coração vai muito bem, obrigado! Este mesmo coração, que já planejou mil vinganças e nunca executou uma sequer, ainda se ressente por não conseguir perdoar a todos que lhe feriram aqui ou ali. Porém, já não planeja vinganças, apenas espera o tempo operar e a vida oferecer a cada um o seu merecido quinhão.

O sujeito agora é um homem de "meia-idade" (se for assim, ao pé da letra, vai viver 94) que faz algumas estripulias de um garoto de 20 e poucos anos e tem certas limitações e hábitos (e até curte ser assim) de um coroa de 70. Agora ele chama de coroa os que intitulava de velhos quanto tinha 20. Só depois do efeito tempo é que descobriu que os referenciais mudam e os de 20 agora o chamam assim. Um coroa relativamente "enxuto", até poderia se dizer. O referencial é que faz a diferença.

Até aqui deixou plantadas algumas árvores, idéias (inclusive neste blog) publicou coisas escritas, ajudou a botar dois meninos no mundo (um já não mais tão menino assim), compôs e gravou músicas e ainda tem um "mói" de inéditas que sonha gravar um dia, deu sua pequena, mas comprometida, contribuição à história da UEPB. Plantou amigos que não os deixam sentir-se sozinho nunca, apesar de gostar de certa solidão. Eis o "pequeno perfil de um cidadão comum", como diria o compositor popular.

Entre idas e vindas, perdas e danos, prós e contras ainda acha que está no lucro. Sente-se feliz em seu mundo tentando gozar de todas as coisas boas que a vida lhe oferece e amargar resoluto todas as agruras do o mundo lhe impõe. No mais, é esperar pra ver os próximos quarenta e sete...

Eis um breve balanço de uma vida em movimento!

9 de novembro de 2009

O (MINI) VESTIDO DA DISCÓRDIA


A notícia mais quente da semana e ao mesmo tempo a mais mobilizadora dos meios de comunicação nacional, no momento, foi a expulsão da estudante Geisy Arruda, 20 anos, do quadro de estudantes da Universidade Bandeirantes (Uniban).

A moça da pauta, uma jovem reboculosa de cabelos transformados, causou espécie ao inexplicável universo dos machos de São Bernardo do Campo-SP, quando compareceu para assistir aula com um vestidinho vermelho, com pano sobrando nas mangas e escasso na parte de baixo.

Inevitavelmente lembrei de um xote cantado por Gonzagão, lá pelo final dos 70 e inícios dos anos 80, de autoia de Luiz Ramalho que vale a pena lemebrar a letra inteira:

"Comadre Joana sempre reclamou


Da minissaia que a filha tem

O namorado se invocou também

E certo dia pra ela falou:

Tua saia, Bastiana, termina muito cedo

Tua blusa, Bastiana, começa muito tarde


Mas ela respondeu: Oi, facilita

Pra dançar o xenhenhém, oi, facilita

Pra peneirar o xerém, oi, facilita

Pra dançar na gafieira, oi, facilita

Pra mandar pra lavadeira, oi, facilita

Pra correr na capoeira, oi, facilita

Pra subir no caminhão, oi, facilita

Pra passar no ribeirão, oi, facilita"

 
 
Mas, ora vejam só!
 
Se lá em tempos pretéritos (já se passaram 20 anos da morte do Rei do Baião) isto já era levado na onda, já se tinha tornado coisa banal, qual mesmo o sentido de tanta balbúrdia por causa de um vestido (ou minissaia) que termina mais cedo? Um olhar crítico sobre o fenômeno, completamente desprovido de juízos de valor é impossível.
 
O fato de conviver há mais de 29 anos com jovens universitários, tanto na condição de aluno quanto exercendo a docência, me dá uma certa noção no sentido de falar de um determinado lugar. Este lugar, em última instância está junto da tolerência. Posso afirmar que já vi quase tudo neste sentido (sem duplo sentido) quando se trata de moças de saias curtas e pernas cruzadas. Porém, nunca saí do meu lugar de educador, inclusive aconselhando, quando achei necessário, algumas a se protegerem.
 
O que causa espécie também, por outro lado, é que as mulheres conquistaram tal espaço no mundo moderno que lhes permite usar e, às vezes, abusar no uso da (pouca) roupa. Entretanto, isso virou uma banalidade de tal ordem que nem vejo mais as expressões de surpresa ou mesmo felicidade geral da macharia abestada com a passagem requebrante de qualquer jovem, a não ser que chame a atenção pelo conjunto da obra.
 
"E aí me dá uma tristeza no meu peito / feito um despeito de eu não ter com quem contar...", pois o problema é que a moça em pauta, em minha humilde opinião de macho, pelo conjunto da obra nem mereceria atrair para si tanta atenção. Afinal, ela estava vestida para dois eventos: uma aula e depois uma festa. Qual o problema? Qual o problema em gostar ou não de suas roupas ou do seu jeito de vestir e andar balançando seu patrimônio apertado naquele vestidinho curto?
 
Se ela tivesse se ofendido e (feito Maria Brexita, uma doida de saudosa memória, lá de Juazeirinho), num gesto de desespero, mostrado as partes pra quem quisesse ver, exibido o que não devia, ao menos naquele lugar reservado ao saber... praquele magote de marmanjos aparentemente obsediados... eu até admitiria a reação.
 
Todavia, apenas pelo uso da roupa, confesso que ela passaria por mim em qualquer lugar público ou privado merecendo, no máximo, um "olhar de conferência", como compete a 9 de cada 10 homens que eu conheço. O que queria então aquela macharada ensandecida escrachando a pobre moça com palavras de ordem e gritos de p... p... p...! E olhe que nem sei se ela é ou não. Porém, em qualquer circunstância, sendo o que seja, ela tem direito de andar, ir e vir, sem que se berre em coro que ela é isto ou aquilo.
 
Tenho certeza que muitas moças, centenas, milhares, em vários recantos deste país, têm ido às aulas, às missas, aos shopping centers com trajes idênticos e, às vezes menos compostos na parte de cima. Mais uma vez indago: qual o problema? Tenho certeza que boa parte daqueles jovens ensandecidos e defensores da moralidade e dos bons costumes que a UNIBAN protegeu expulsando a jovem, já ingeriu bebida alcoólica, já fumou maconha na universidade ao menos uma vez, já deu um amasso escandaloso em alguma donzela no interior da universidade ao menos uma vez, já fez isto em outros ambientes menos indicados ao menos uma vez. Qual o problema?
 
É bom lembrar que os linchamentos começam desse mesmo jeito. E aí as catarses coletivas acontecem, assim como em tempos muito remotos homens de carne e osso eram jogados aos leões para o divertimento da aristocracia.
 
Creio que nossa sociedade andamos perdendo coisas. Uma delas, sem dúvidas é o verdadeiro senso de preservação dos nossos direitos dos direitos dos outros, do exercício da cidadania e da justiça, da tolerância, do bom senso. Se não, coisas como essas não aconteceriam. E, se acontecessem teriam sido resolvidas no âmbito da própria instituição, sem maiores problemas, antes que tomasse tais proporções.
 
Pensando bem, acho que a moça perdeu muita coisa. Porém, pelo desenrolar dos fatos, ela sairá ganhando depois e muito. Perdemos nós todos brasileiros, e muito.

2 de novembro de 2009

O MAIOR FAZEDOR DE "BURÉ"


Não sei se você já ouviu falar em Buré. Não encontrei no dicionário nem encontrei palavra assemelhada que pudesse justificar seu uso. Segundo a Wikipedia, Buré é uma comuna francesa na região administrativa da Baixa-Normandia, no departamento Orne. Estende-se por uma área de 5,53 km², com 94 habitantes, segundo os censos de 1999, com uma densidade 17 hab/km².

Entretanto Buré é o ajuste de nivelamento feito sobre a parede de areia de praia que forma aquelas piscininhas feitas por nós, gente grande, para deleite da meninada. Explico: Estava construindo uma dessas piscinas e meu parceiro Vinícius diz pra mim:
- Papai, você bota a areia e eu faço o Buré!
- Como é, filho?
- O Buré, papai! Eu sou o maior fazedor de Buré!

Entendeu agora? Pois bem, Buré nada mais é que isto, a regulagem manual ou com uma pazinha de plástico que você faz no topo da parede de uma piscininha de areia de praia. É o Buré que deixa a parede mais bonita, digamos assim. Até ontem, pra mim essa palavra era inexistente. Não é mais! Pronto!