Colhendo acerolas aos montes sinto uma sensação gostosa de realização. Algo assim tão simples como tomar um copo d'água da minha quartinha, fria, com gostinho de barro e de infância. Olho pra Pitangueira que está crescendo e sonho com suas azedas frutinhas e até arrisco pensar num licor especial que prepararei pra distribuir com amigos.
Colhendo mamões lindos, amadurecidos no pé e tão aguados sinto uma pontinha de frustração e outra de alegria, ao tempo em que faço uma constatação quase fria como a água da quartinha de barro: a vida nem sempre é doce. Aliás, tão poucas vezes a vida é doce que mais parece esse mamão que resolvo comer, mesmo com seu sabor de quase nada, como se todo o açúcar do mundo tivesse se escondido na hora de passar por aquele Mamoeiro.
A questão é que tanto o pé de acerola quanto o de mamão me foram presenteados por Dona Neide, minha mãe. Com sua mania de produzir mudas e sair presenteando me fez cativo de tal costume. Tenho até algumas de graviola e atemóia que consegui produzir em casa e espero que virem frondosas fruteiras e deem bons prazeres a quem as adotar.
Assim como as maravilhosas acerolas gigantes e de macia polpa me lembram as coisas boas e doces, as maravilhosas reminiscências de minha mãezinha e sua alegria motivada por coisas tão simples e pequenas, o mamão aguado também me fazem lembrar o aguado da vida e sua via crucis de quase 25 anos entre médicos e hospitais lutando por seu bem mais precioso, a própria vida.
Hoje vejo com certa tranquilidade que, pra ela, havia chegado seu tempo de "desistir" de lutar contra algo inexorável. Afinal, somos todos assim! E como na vida há tempo pra tudo: pra escolher sementes, pra semear, pra regar, pra podar, pra colher... há o tempo de completude de ciclos, essencialmente de vida, que se completam e se reiniciam com a morte. Ou seja, deixamos de ser o que somos pra nos transformarmos em outras coisas. E olhe que falo apenas de física. Assim como tudo o mais estamos o tempo todo nascendo, morrendo, terminando, começando e recomeçando...
Por hoje, morro nas coisas que deixei de fazer, renasço nas coisas que fiz durante o dia, nos amigos (de sempre) que abracei, no cheiros que senti, nas idéias que plantei, nos sonhos que alimentei, naquilo que sempre fui e estou sendo, diferente sempre e parecido como se não fosse.
Vai entender...
Um comentário:
Oi Rangel.
Ótimo texto, maravilha de reflexão e finalização triunfal.
Só vindo mesmo dessa mente, gloriosa, saudosa e sensivel.
Um ótimo fim de semana de muita paz.
Um abraço,
Débhora Melo.
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