6 de maio de 2009

CARTAS

Vendo a imagem você sabe que é um envelope de carta, pois não? Uma espécie de embalagem que pode até ser de cor branca(mais moderno e com jeitão oficial, empresarial), mas me refiro ao tradicional que seria branco (meio amarelado porque possuía pequenas listras azuladas por dentro para garantir certa opacidade por fora e o sigilo da correspondência), com bordas listradas diagonalmente em branco, verde e amarelo, alguns possuíam quadrinhos onde se escrevia o Código de Endereçamento Postal (CEP, que já foi apenas CP) e num cantinho, impresso, um retângulo azul com a expressão "via aérea" e à francesa, "par avion", em letras brancas. Chique, não?
A pergunta é mais que básica porque algum leitor com menos de trinta anos pensará: que coisa, sei o que é sim! Mas se a pergunta for: Você já usou isto?, aí a coisa muda. Se você já escreveu uma carta sabe do que falo. Digo uma carta de verdade, daquelas escritas em papel (de preferência com 'pauta' ou linhas se preferir), com caneta, depois dobrou (dobradura de papel de carta é um detalhe à parte) e encaixou no envelope, colou um ou mais selos e levou aos correios para postagem, certamente sabe que essa é uma cena do passado. Aliás, ainda sobrevive com os dias quase contados para acabar. Fui um escrevedor de cartas. Cartas longas! Fiz amigos por correspondência (uma espécie de ORKUT ou MSN dos anos 70), escrevi cartas para amigos reais, para parentes, e escrevi cartas apaixonadas, cartas de amor! Você sabe o que é isso? Escrever uma carta pra alguém e passar uma semana, quinze dias esperando uma resposta? O carteiro passar todo dia e ante aquela expectativa de ouvi-lo gritar da porta "correio!" e você correr pra abrir o envelope com cuidado, desdobrar a carta e ler de um fôlego só, tentando lembrar sobre o que tinha escrito, perguntado, comentado, etc., e que estava ali sendo respondido... e novamente dito e perguntado... Recebi cartas de mesmo teor em todos os sentidos. Cartas longas, curtinhas, perfumadas, com lembrancinhas, em papel especial, cheias de desenhos, personalizadas, carimbadas com beijos... Saudosismo? Não sei, mas, como já disse alguém, o passado não volta, ou águas passadas não movem moinhos, coisas do gênero. Não lamento o progresso nem as vantagens enormes do presente. Imagine o futuro sem celular ou internet! Confesso que, vez por outra, tenho vontade de escrever cartas, de colocar ali as minhas impressões digitais, minha letra no papel, o tempo congelado em que se escreve, a notícia em suspenso, a conversa que você sabe que ficará registrada e se o (a) destinatário (a) for cuidadoso (a), um dia aquilo ainda poderá ser lido novamente. Cá pra nós (e o povo da rua, como diríamos lá em Juazeirinho) eu confesso que ando achando que águas passadas movem moinhos sim! A depender das águas e dos moinhos! Nos tempos modernos águas movem turbinas. Imagine alguém perturbado por uma espécie de tentação para uma espécie d'El ingenioso hidalgo Don Quixote de La Mancha'... Mas sobre as cartas, acho uma grande invasão de privacidade o povo ficar publicando correspondência de quem já morreu, mas figuras importantes da história têm suas vidas devassadas pela ímpeto fofoqueiro do povo em querer saber o que o sujeito disse pra fulana, pro fulano, em mil oitocentos e não sei quanto... eu mesmo já me interesse por coisas do gênero. Nossa! Fico imaginando o que guardaremos de nossas correpondências pro futuro. O que ficará? Alguns emails gratuitos já resolveram um problema enorme de espaço de armazenamento, o que nos obrigava a ficar apagando tudo de tempos em tempos. Que tempos, hein! O que você faz de sua correspondência? Espero que ninguém resolva mexer nas minhas velhas cartas quando eu ficar velhinho ou mesmo depois que eu for "envelopado". Aliás, tou desconfiado que isso vai acontecer mais dia, menos dia. Minha esperança é que demore bastante! Até lá, espero arranjar tempo pra fazer uma visita ao passado de correspondências amarrotadas pela ação do tempo, mas que não embotam as histórias nem as vivências maravilhosas dessas sensações que, para além da afetividade, eram também táteis, sensoriais mesmo. Já o teclado e a tela...

5 comentários:

Aninha Santos disse...

Amo computador, na verdade meu pulso dói quando escrevo e por isso os textos das agendas e as cartinhas de amor se tranformaram em pequenas frases ou postagens nos blogs.

Mesmo assim continuo apaixonada pelas cartas e sempre que posso revisito meu passado, e como acontece nas novelas fico escutando a voz da minha mãe e sinto seu afago em meus cabelos enquanto leio suas cartas com marquinhas de lágrimas. Nesses momentos normalmente choro e agradeço por naquele tempo não existir e-mail: eu perderia o cheirinho dos meus amados que permanecem guardados no papel.

Xêro pra tu menino véi. Te amo!

Débhora Melo disse...

É Rangel, escrever carta está em extinção.
E confesso que gosto mais de receber do que de escrever, digo, por que recebi por esses dias uma carta de um amigo que recusa a tecnologia, apesar de precisar. E como é bom receber, o ritual de ver, tocar o envelope, abrir e ler, nos dar uma sensação de aproximação. È uma pena que as tradições vão se perdendo, lembro-me que fazia competições com as amigas para quem mais recebia cartão de Natal via correio. Nossa, cada cartão uma emoção e como eram bonitos...
È... são águas passadas, mas que poucos, os raros, ainda permanecem relutando com o presente cada vez mais frio!

Eça de Queiroz descreveu bem, no livro Primo Basilio, a sensação de receber uma carta esperada.

...Tinha suspirado
Tinha beijado o papel devotamente.
Era a primeira vez que lhe escreviam aquelas sentimentalidades
E o seu orgulho dilatava-se ao calor amoroso que saía delas
Como um corpo ressequido que se estira num banho tépido.
Sentia um acréscimo de estima por si mesma,
E parecia-lhe que entrava enfim
Numa existência superiormente interessante.
Onde cada hora tinha o seu encanto diferente.
Cada passo conduzia a um êxtase
E a alma se cobria de um luxo radioso de sensações.




Um abraço,

Débhora Melo.

P.S - Sim... um cheiro em Kátia, rsrs!

KÁTIA LIMA disse...

RECEBER UMA CARTA, ESCREVER UMA CARTA, UM RITUAL INEVITAVELMENTE AGRADÁVEL.
É COMO SENTIR A PRESENÇA DO OUTRO.
ADOREI, RANGEL!

DÉBHORAAA...OUTRO CHEIRO, ÉS UMA PESSOA LINDA, EU ACHO E CREIO QUE MUITOS ACHAM.

E PRA TU RANGEL JUNIOR, GRANDE MESTRE DAS PALAVRAS... UM CHEIRAO...KKKKKK

RANGEL JUNIOR disse...

Puxa, vida! Valeu! Vamos por aqui enquanto o prazer de contar histórias e falar dessas coisas for mais importante que a correria das responsabilidades.
Viva a vida sensível!

Anônimo disse...

Nossa esta fuçando a internet, e encontrei esse texto lindo sobre as cartas, nossa voltei no tempo quando mandava e recebia cartas de uma amiga que um ano estava no Parana e outro no Pará, Quando ela estava no Pará,nos falavamos por cartas e era muito gostoso.Acho que é isso que vou fazer nesse momento.Escrever uma bela carta a ela.
Muito obrigada pela boa recordação.

Ass.Josiane / São Francisco do Sul SC