
"Sou um poço de saudade - sou a vida -
Tão cuidadosamente represada
Em parede circular - bem rejuntada -
E a saudade lá no fundo, ali... contida.
Meio dia - sol a pino - iluminada,
Evapora-se a saudade ante a lida.
Faz de conta que se foi - é tão fingida
Que retorna quando é alta madrugada.
Feito orvalho, ela volta, se condensa.
Mas engana-se quem vendo-a, 'inda pensa
Que ela em mim é passado - coisa rara.
Sou o único quem sabe - quem assume -
Que ela aumenta e abaixa o seu volume,
Pois no fundo há uma fonte que não pára."
D'Os Sapatos Apaixonados'
2 comentários:
Belo o seu texto. Dá uma sensação de movimento e trás muita imagem. A 'parede circular bem rejuntada' dá a sensação de aprisionamento, e paradoxalmente, de segurança e infinitude. Consegui sentir o cheiro do barro fresco...que lembra o cheiro de chuva...que molha e faz renascer. A 'fonte que não pára', dá a idéia de algo que não tem fim e independe de nós, (e isso é inquietante)e ao mesmo tempo de algo que brota suavemente da terra e faz jorrar a própria vida...E essa é a grande busca.
No contexto, é um escrito que remete a alguma perda, dor ou frustração. Se lido com vagar, repetidas vezes, é movimento e lembra a própria energia da vida.
Parabéns, mais uma vez.
Nossa! Fiquei encabulecido. Mas é só da minha matutice mesmo. Que beleza descobrir coisas que fiz meio instintivamente. A idéia motriz é exatamente essa, mas a carga de melancolia é verdadeira também. C'est la vie!
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