31 de agosto de 2006

MULHERES

Escrevi esse pequeno texto no Dia Internacional das Mulheres, 08 de Março de 2006. "O título acima sugere uma canção de sucesso na voz de Martinho da Vila que dizia sobre a variedade e tipos de mulheres com quem havia convivido, ou, de uma forma mais popular, como inicia a canção: “já tive mulheres de todas as cores…”! A canção, ingenuamente, mas preconceituosamente, sugere posse, poder, propriedade. Dito por Rita Lee, “mulher é bicho esquisito / todo mês sangra…”, o ‘esquisito’ e o ‘bicho’ aqui não soam como preconceitos nem parecem ser a tônica do sentido da canção.Dizia outra canção que mulher brasileira é feita de amor, pois afirmava Benito Di Paula: “mulher brasileira em primeiro lugar”. Numa das canções mais cantadas em homenagem às mulheres que lutam, uma das estrofes fecha com a frase: “Maria, maria, mistura a dor e alegria (…) quem traz na pele a marca / possui a estranha mania de ter fé na vida”.São milhares de exemplos no cancioneiro popular brasileiro exaltando a beleza, a garra, a força, o romantismo, a sensualidade e até mesmo as curvas da mulher brasileira. Bons tempos em que o mais ousado era dizer que “a vizinha (…) mexe com as cadeiras (…) ela mexe com o juízo do homem que vai trabalhar”. Arriscado era falar de beijo suave ou ardente, de preferir as curvas da Estrada de Santos às do corpo da mulher, ou ainda que “no teu corpo é que eu encontro / depois do amor o descanso e essa paz infinita / no teu corpo minhas mãos / que deslizam e se firmam / numa curva mais bonita”. Velhos tempos! Ultimamente, anda muito em voga cantores e (pasmem!) cantoras chamarem as mulheres de “cachorras”, exaltarem as virtudes das “raparigas”, propagandearem a prostituição, banalizarem o sexo, transformarem a mulher, antes mesmo machistamente enaltecida, em mero objeto. Pior: não mais de cama e mesa, agora, pura mercadoria, expostas em vitrines iluminadas por jogos de luzes e fumaça cênica e disputadas pelo quem dá mais no leilão das vaidades. Vozes roucas, numa sensualidade fraudulenta, um gestual pra lá de explícito (que antigamente só tinha espaço nos ‘inferninhos’ e streepteases da vida), ganham palcos, DVDs e grandes telas de TVs nos bares e nos horários nobres, enchem a sala de jantar de sua casa de bundas recauchutadas e peitos turbinados por silicone. Mais ainda: vendem isso com a concessão pública de canais de TV e, muitas e muitas vezes com dinheiro vivo, pago com os cofres do erário em nome de pretensa diversão e de supostas festas populares que, como dizia Jessier Quirino, estão mais pra “putanhagem-fora-de-época”! Antes fosse, como diziam antigamente, “pão e circo”. O circo não dá mais, pois é muito ingênuo. Bom mesmo é o culto ao corpo da mulher, a encenação de um coito e a extrema vulgarização do sexo “na boquinha da garrafa” feita por menininhas de sete, nove anos de idade. Tudo sob olhares complacentes e às vezes estímulante de adultos que depois ficam se perguntando sobre o porquê de tanta gravidez na adolescência. As mulheres ganham espaço no mercado de trabalho e perdem no mercado do corpo, no mercado da política, no mercado da moda, no mercado do sexo, no mercado da vida. Ora, mas se tudo está se transformando num grande mercado, por que não sermos também mercadorias?Dona Beatriz, minha tia, vive há mais de dez anos dependendo dos outros para quase tudo, há tempos sobre uma cama, atrofiada com sua “amiga” artrite. Do alto de sua sabedoria de 69 anos é capaz de levantar o astral de muita gente nova que a visita para conversar sobre amenidades, contar piadas, resolver charadas, fazer orações ou simplesmente bater um papo. Dona Neide, minha mãe, pra completar 68 este ano, toma 13 comprimidos por dia, carrega um marca-passo no peito, perdeu uns 70 por cento da visão, cardiopata crônica e diabética, não perde tempo sem se mexer lentamente dentro de casa fazendo tarefas domésticas, cuidando de suas plantas, acompanhando a vida, acertos e desacertos dos filhos e, quando reúnes dois ou três deles ou duas noras já chama pra tomar uma taça de vinho e dar umas boas risadas. Helena Serrazul é comunista desde a juventude, foi presa e torturada (do que tem várias seqüelas) juntamente com seu eterno companheiro Chico Passeata, teve um filho nos cárceres da ditadura e continua mais ativa que nunca. Sessenta e tantos anos, é doutora, professora e pesquisadora da Universidade Federal do Ceará, presidente do sindicato dos professores, ri à toa com qualquer piada, fala da política e age com um vigor e alegria de quem está começando. Vou parar de falar em mulheres! Queria somente registrar minha quase devoção por figuras como Dona Zefita (minha primeira professora em Juazeirinho, ainda em atividade), Tereza Braga (guerreira pelos Direitos Humanos), Margarida Alves (mártir da luta pela terra), Elza Monnerat (guerrilheira na epopéia do Araguaia e comunista até a morte aos 91 anos). Nutro uma profunda admiração por mulheres que, mesmo com todas as facilidades das modernas cirurgias ainda preferem encarar a incerteza e as dores de um parto normal. Agora falando sinceramente, aqui pra nós, confesso uma pontinha de inveja das mulheres, carregando uma vida no ventre, tirando do próprio corpo o alimento do novo ser que veio ao mundo. Sei também que muitos marmanjos por aí pensam assim, mas não têm a coragem, como eu, de assumir. Como são belas as mulheres com suas barrigonas, uma bebezinho buliçoso se revolvendo, seus umbigos estufando, seus peitos vazando de leite, a vida brotando pelos poros, a natureza se preparando para realizar sua obra mais simples. Não vejo nesse reconhecimento nenhum demérito, fraqueza ou suposto desejo de ser mulher. Fiz minhas escolhas muito cedo e continuo firme com elas. Em meio a tantas comemorações (algumas cheias de falsidade e formalidade) pela passagem do Dia Internacional da Mulher, em meio a tantas homenagens, a melhor que posso fazer é uma bela celebração no altar de Vênus, uma rosa, um brinde, um beijo, um colo e um cafuné. Bem que gostaria de dizer: “Camilla, eu te amo”! Mas isso eu digo sempre!Não sei como dizer isso agora, mas antes de tudo acontecer era como se eu soubesse que você viria e me tomaria de assalto e atropelaria os meus dias e me deixaria tonto e me daria um lindo filho e encheria de alegria as minhas horas, ressignificando minha existência e (re) definindo a transitividade do meu verbo amar. Ah, essas mulheres! Elas vão longe!

2 comentários:

Anônimo disse...

Entrei na UEPb em abril de 1989, nos anos que se seguiram começei a participar das famosas greves, e com isso uma coisa que não esqueço , o embate, o duelo que existiu entre as forças, as lideranças da aduepeb, e é aí realmente quando se sabe o que é ser servidor de uma ies pública ...
tínhamos Junior, Marlene, não lembro se Andrade já existia,e tínhamos Valderi, Lamartine, e outros...foi quando ouví pela primeira vez que alguém raciocinava pela barriga, ou pelas tripas, não lembro, querendo o autor da frase dizer que nós, naquele momento estávamos esqueçendo da razão e a abdicando da luta pelo compromisso familiar, de ter que botar comida em casa...lendo hoje alguns dos artigos publicados neste blog...me senti remanescente, e notei que aquele autor, de personalidade forte, e que pesa ainda uma ponta de tristeza por não ter visto o duelo dele com Sebastião Vieira, mas, que também sinto-me culpado pela falta de apoio que deveríamos ter dado, o mesmo que foi dado a Marlene,se não por mim, que estava no apoio à candidatura de neu amigo Flávio Romero, que não me arrependo, porém louvo os guerreiros que tiveram a coragem de mudar a cara da UEP, sim, como falava, que aquele autor consegiu depois de tantos anos, se manter na mesma postura cultural, sábio de palavras simples...incluiu inclusive no repertório de suas palavras, vísceras... muitos sabem da admirição que tenho pelo quase poeta, quase cantor, quase compositor, mas, completo artista...

Grande abraço,

Cláudio Leôncio(Cacau)

Anônimo disse...

A pressa causou algumas faltas de letras nas palavras...
Como também a troca de reminiscente por remanescente...

Cláudio Leôncio