Palavras e imagens. Impressões e olhares sobre o mundo e as relações. Um pouco de cada coisa: educação, universidade, cultura, arte, política, gente...até poesia e outras formas de escrita.
4 de setembro de 2007
ABRINDO O BAÚ E CONTANDO HISTÓRIAS - Parte II
A foto é do ano de 1976 ou 1977. Banda Marcial do Colégio Municipal Severino Marinheiro. Desfile do 7 de Setembro. O tocador de bumbo (ou Bombo) sou eu!
Era de fato um orgulho nosso, de todos, o desfile do 7 de setembro, dia da Independência Nacional.
Começávamos a semana com o hasteamento da bandeira na parte da frente do colégio, em fila, do menor para o maior. Entoávamos o Hino Nacional, devidamente ensaiado antes e com a letra fartamente ensinada no período anterior, principalmente a partir da última contracapa dos cadernos da FENAME.
A preparação para o Dia da Independência era algo fantástico. Tempo de extravasar fantasias, reavivar o sentimento patriótico e demonstrar, na prática, como se deveria reverenciar as Armas Nacionais, a Bandeira Nacional, o Hino Nacional Brasileiro.
Logo a partir do retorno das férias do meio do ano começavam os ensaios. Os 'escolhidos' para tocar na banda (que era a maior honraria pros meninos) começavam os ensaios em separado e no caso das meninas escolhidas para 'baliza' (que era o maior orgulho do lado feminino) já começavam a treinar as evoluções e malabarismos que iriam fazer à frente da banda e de cada um dos 'pelotões' do desfile.
A nomenclatura utilizada talvez não fosse a mais adequada. Entretanto, o nosso sentimento de civismo e comemoração sincera da "independência do Brasil" era algo de arrepiar até os mais insensíveis.
A preparação durava ao menos uns dois meses e às vésperas do desfile ensaiávamos diretamente na rua, com banda e tudo o mais. Somente a farda era a surpresa do 7 de setembro. A farda da banda, as indumentárias das balizas, os 'pelotões alegóricos" que ressaltavam belezas nacionais (na linha do ufanismo estado-novista ou do governo do golpe de 64), essa parte mais artística e mais nobre somente era conhecida no dia do desfile. Era pra causar sensação!
Na véspera do desfile juntávamo-nos todos da banda pra 'passar' os últimos detalhes e dar o último polimento nos instrumentos e fazer a afinação final. Bumbos-fuzileiros, surdos, caixas, taróis, pratos, cornetas... tudo tinindo com um bom banho de 'kaol' e uma flanela esfregada à exaustão.
A saída do colégio era algo fantástico, rodeado de tensão, de expectativa e lá íamos nós, pequenos brasileiros saudando uma independência da qual não tínhamos, a bem da verdade, pouco mais que uma vaga idéia a partir do quadro fantasioso do "Grito do Ypiranga" pintado pelo genial paraibano Pedro Américo.
Dois outros momentos eram considerados o ápice da festa: primeiro a passagem em frente ao palanque das autoridades (civis, militares e eclesiásticas - era assim que anunciava o locutor Inácio na difusora), geralmente armado em frente à prefeitura. O segundo momento ficava por conta do 'encontro de bandas' que era o momento em que, em alguma parte do desfile cruzávamos as bandas marciais do "Colégio Novo", com o "colégio Velho".
Pra ser fiel à verdade dos fatos, aquele encontro era o momento da velha rixa política entre os Marinheiros (do Colégio Municipal Severino Marinheiro - o Colégio Novo) e os Matias-Vital (do Grupo Estadual Manoel Vital - o Colégio Velho).
O 'encontro das bandas' era o cruzamento, em algum momento do desfile, quando as bandas passavam, em sentido contrário e cada uma tentava 'tirar um dobrado' mais bonito ou mais complexo, todos batiam nos instrumentos ao ponto de "rasgar os couros" (já peles hidráulicas) na tentativa de abafar o som da outra banda e comprometer o andamento, o compasso, o ritmo.
Apesar da história comprida, vale a pena lembrar que, àquela época, o "Colégio Velho" torcia pra que o 7 de setembro fosse dia de sol, pois, em razão de carências materiais, a maioria das peles dos seus instrumentos eram peles animais e não sintéticas, o que exigia um bom tempo ao sol para "esticar" e garantir a afinação com boa sonoridade. Agenor e Nego Toca que o digam!
Eu, à frente da banda, ao lado de Nenen de Jaime, com meu 'fuzileiro', esparadrapo nos dedos, elástico nas baquetas pra garantir uns malabarismos bacanas e uma disposição de "mamar em onça" era o exemplo vivo da alegria e êxtase. O verdadeiro orgulho nacional.
De tanta saudade resolvi ir a Juazeirinho assistir ao desfile do 7 de setembro, fotografar pessoas e cenas do desfile pra avivar a memória e fazer tirar um pouco o mofo do meu baú de reminiscências.
Sem aquele ufanismo absurdo do governo de 64 creio que o 7 de setembro ficou mais brasileiro, mais real.
Passando por Monteiro na semana passada, em um evento da UEPB, ouvindo ao longe o ecoar da fanfarra de algum colégio da cidade, ensaiando pro 7 de setembro, era impossível não arrepiar. Como chorão dos bons, os olhos foram marejando, a voz embotando na garganta e fui saindo aos poucos de perto da roda de conversa pra não ter que dar explicações a ninguém.
Afinal, sei lá se iriam entender essa história comprida e mais encompridada ainda pelos rodeios do contador. Sei lá...
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Um comentário:
Ei bixin, atualiza esse blog...tô com saudade dos teus textos...coloca uns negocinhos d'Os Sapatos Apaixonados, ou música, ou notícia da acerolazinha (ela sobreviveu Às formigas?), até da judiação provocada pelo quadro viral (!) tanta coisa pra contar...cuida!
Xêro no ôi.
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