25 de outubro de 2025

O Espelho d'Alma no Agreste: A Crônica Poética do 'Sempre Sonhar' de Jorge Ribbas



Por Rangel Junior

A Convocação da Arte e a Orquestra da Intimidade

O calendário sideral alinhou-se em 24 de outubro de 2025, e o som da esperança ressurgiu em forma de álbum: "Sempre Sonhar" de Jorge Ribbas. O lançamento, celebrado com um concerto noturno para quarenta privilegiadas pessoas, transcendeu o evento musical; foi a abertura de um portal, um convite à escuta atenta que só a verdadeira arte pode proporcionar. A alma do Agreste, sábia e melódica, vestiu-se de gala. E o público presente realizou uma escuta atenta, afetiva, amorosa, educada. Tudo que se deve fazer ao ouvir uma música pela primeira vez.

Ribbas, o mestre que faz de seu violão a extensão do pensamento, não estava sozinho. Sua música floresceu sustentada por uma constelação de talentos: João Valter Filho (Teclados) pintando as paisagens harmônicas, Matheus Duarte (Guitarra) traçando trilhas elétricas de rara beleza, Cleisson Melo (Baixo) firmando a âncora rítmica com elegância, e Cláudio Montevérdi (Bateria) tecendo o tempo com precisão de ourives. Com Ribbas, no centro, violão e guitarra, a arte era tecida ao vivo.

No palco, não vimos apenas o professor, mas o alquimista. Aquele que, com a mesma destreza, maneja a poesia do quase rock introspectivo em temas como "Mutantes" e a lírica camerística de Cena Louca, provando que a complexidade é apenas a face oculta da beleza.

O Álbum: O Rio Sereno das Composições

"Sempre Sonhar" não é apenas a ideia de um disco; é um rio que corre por dentro. A faixa-título é a sua nascente, um sopro que se recusa ao cinismo, um farol aceso na neblina dos tempos. Mas a profundidade da obra reside nas suas margens contrastantes:

  • O sussurro ancestral de "A Lua": Em um aceno reverente à grande compositora Socorro Lira, Ribbas desvela a canção como uma oração. O arranjo é uma tapeçaria minimalista onde o violão, como uma harpa de cristal, dialoga com o teclado que emula um cello sutil, chorando baixinho na vastidão da noite. É o instante de MPB mais puro, onde a voz de Ribbas se torna a brisa que embala sonhos, e a poesia é a única virtuosidade necessária.

  • O afeto medieval de "Távolas": Esta parceria com Kiko carrega um perfume pop-romântico, mas com raízes fundas. O título, que evoca as mesas de cavaleiros, sugere uma melodia nobre, um encontro de afetos. A canção é um diálogo entre o Agreste e as estradas do Clube da Esquina, um convite a sentar-se à mesa da canção e compartilhar a energia da Paraíba com o mundo, provando que o regional pode ser, e é, universal.

  • "A Boniteza do Mundo": O manifesto em canção: Aqui, o mestre Ribbas exerce sua sabedoria. A melodia, de uma simplicidade quase sagrada, é sustentada por uma harmonia que bebe na fonte dos cantadores e menestréis nordestinos, transformando o saber popular em arte erudita. É a lágrima de orvalho que revela a vastidão da paisagem. O mundo clama por boniteza, e Ribbas responde com um canto suave, mas ardente, um grito poético de esperança por um universo de irmãos.

O Toque de Midias e a Mágica do Encontro

O que define a experiência do "Sempre Sonhar" ao vivo é a mão do arranjador que não permite o repouso. O som em palco era uma criatura viva, pulsando e se transformando. A guitarra de Ribbas, ora tempestade, ora murmúrio, revelou-se um instrumento de confissão. A plateia foi agraciada com a liberdade da criação: a releitura visceral de cada faixa.

A celebração atingiu um dos seus ápices com a presença da cantora Soraya Laíres. O dueto foi um rio a encontrar o mar, um intercâmbio de vozes que iluminou a universalidade da música de Ribbas, unindo texturas e sotaques em um momento de pura comunhão artística.

Conclusão: A Luz no Horizonte

Jorge Ribbas não segue as correntes; ele traça seu próprio curso. Com "Sempre Sonhar", ele nos oferece um bálsamo, um convite à reflexão que é embalado por uma sonoridade rica e sofisticada. Sua música é o esforço da luz contra a sombra.

Deixamos o recinto com a certeza de ter testemunhado mais do que um concerto: uma declaração de amor à arte. E enquanto o violão de Jorge Ribbas seguir traçando o horizonte, a semente do "sempre sonhar" continuará a germinar.

Nenhum comentário: