Um
amigo longevo me escreveu uma mensagem em que comentava sobre os anos
60, das poucas opções tecnológicas de informação e comunicação,
da censura, etc. Fechava sua curta mensagem com “...mas éramos
mais felizes que hoje.”
Daí eu fui comentar e terminei por me alongar um pouco. Mandei um longo comentário pra ele. O que publico aqui é o texto com ajustes.
“Em qualquer conta haveremos sempre de concluir que “éramos mais felizes no passado”. Muito humano isso. Alguns indicadores. Quando muito jovens, o tempo pra nós é quase uma abstração. É como se nem existisse. Nós o engolimos com uma voracidade de feras. Sabe o por quê? Porque somos cheios, emprenhados de futuro. Ali, o presente é como um copo d’água, que bebemos sofregamente, saciamos a sede imediata e seguimos em frente. Hoje nós somos o futuro. Aliás, somos aquele futuro que sonhávamos no passado. Não do jeito que sonhávamos, mas somos o futuro do passado. Dito de outro modo, talvez sejamos o futuro, porém um futuro cheio de passado e pouco futuro. Uns mais que outros, é bem verdade.
Se ontem éramos muito rápidos e tínhamos pressa em tudo, os dias se sucediam como um eterno despetalar da “folhinha do ano” e nós nem nos dávamos conta direito, agora os dias passam velozes e nós ficamos lentos. Queremos que eles passem lentos, queremos segurar o tique-taque inexorável de modo a ganharmos mais tempo. Tempo, tempo, tempo...que já não é mais uma abstração, mas uma espécie de guilhotina que nos ameaça.
É, meu amigo! Neste momento, vejo o tempo de uma forma extremamente ambígua. É como se ele fosse um grande aliado e ao mesmo tempo meu maior inimigo. Eu acredito que os mais longevos somente o são porque conseguem se manter emprenhados de futuro. Voltar a pintar, por exemplo, é o seu futuro. Planejar coisas novas e realizar coisas novas lhe enchem de futuro. Eu estou nessa. Principalmente olhando para experiências como a sua, do nosso amigo carioca e alguns poucos que vejo nessa linha.
Estranhamente,
cada vez mais sinto que precisamos nos agarrar ao presente como forma
de fugirmos desse “mal do século”, que é a ansiedade. Ao mesmo
tempo, é o que não temos, o futuro, que nos impulsiona adiante.
Esse nosso jeito de ser humanos.
Agora
um desafio: imagine você hoje, com a agilidade e o tesão dos 20
anos… Não vejo futuro nisso. Viver o tempo de hoje e cada coisa a
seu tempo, sem dúvidas é onde reside mais sabedoria. Melhor deixar
como está!
Tirando
a parte da nostalgia e das perdas sucessivas de antigos amigos, o
tempo de hoje é mais complexo e fugaz, por isso envelhecemos
aprendendo a degustá-lo devagar, saboreando cada segundo, cada
pincelada na tela, cada acorde ao violão, cada gole de vinho ou
cachaça, cada cafuné de um filho, um neto, um amor. Tempos em que
um carinho às vezes vale mais que um orgasmo.
Estou
quase entrando nessa fase. Ao menos me preparando pra vivenciá-la.
Venho tentando ser mais cuidadoso com o tempo, respeitando sempre o
meu próprio tempo, ao tempo em que vivo desejando e esperando que
ele seja também generoso comigo.
Bom
dia.
Meu
abraço.
Rangel
Jr.
(Em
02/06/2020)
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