A única vez em que vi meu pai chorar foi num início de noite entre dezembro e fevereiro há 40 anos.
O fato foi depois de um AVC que não tirou sua vida, mas deixou algumas sequelas como uma paralisia lateral parcial e uma amnésia que deve ter sido um dos seus maiores sofrimentos. O meu eu sei que foi.
Lembro de seu retorno do hospital em Campina, onde esteve internado por uns dias. Impossível esquecer seu olhar vazio, parado no tempo diante de mim ao pedir-he a benção e sua reação pasmada, como a perguntar "quem é esse garoto?"
Dias depois, recuperando aos poucos da paralisia e também de parte da memória deu-se um episódio marcante.
Zé Neto já estudava no Gigantão da Prata e morava em Campina, na casa de Tia Zorilda e Seu Manoel Batista.
Eram tempos muito difíceis. Estávamos em férias escolares e resolvemos buscar trabalho na fábrica CAULINEX no distrito da Barra, ali a 9 km no caminho para o Junco do Seridó.
Num desses dias, ao retomarmos do trabalho, cabelos, cílios, sobrancelhas, pele, tudo esbranquiçado do pó do caulim, ao nos ver em casa, já noite ele Perguntou: "onde vocês estavam? Trabalhando?" Ante nossa resposta, um choro incontido banhou seu rosto e foi uma das poucas vezes na vida em que ganhei um abraço do meu pai. Poucos meses depois, um enfarte o levou.
Isso foi há mais de 40 anos, num 27 de maio como este, que trouxe de volta as cenas aqui descritas e com elas um suave sopro de saudade.