Vendo tantas mensagens religiosas por estes dias, uma me chamou a atenção. Jesus, já na cruz, olha para sua mãe e o discípulo João e lhes diz: "Mulher, eis o teu filho...eis a tua mãe".
Fez-me lembrar, não sei porquê, de uma longa história que tento contar resumidamente aqui.
A jovem senhora tinha 24 anos quando trouxe à luz o terceiro filho: o mais velho ainda a completar 2 anos, o segundo com 10 meses e 6 dias. O caçula nasceu quando o pai já estava no Rio de Janeiro "tentando a vida" no ofício de sapateiro. Ela na casa dos pais dele, numa cidadezinha do interior da Paraíba.
Este mais novo rebento, quando contava 8 meses, foi vitimado por uma diarréia sem fim que teve por consequência uma desidratação. Naquele tempo e naquelas condições nutricionais era quase uma condenação à morte.
Depois de tratado por dois ou três dias com remédios caseiros, o que se tinha, o quadro foi agravado e ela decidiu levar seu bebezinho a Campina Grande.
Todos diziam em uníssono: "vai perder tempo e dinheiro (algo raríssimo naqueles tempos de pobreza grande). Esse menino não tem mais jeito. Entregue-o a Deus. Veja a 'nata' nos olhinhos dele, já é um anjinho..."
Então, Maria Eneide afirma resoluta:
"Me arranjem o dinheiro da passagem que eu levo ele a Campina. Se morrer eu o trago de volta nos meus braços pra enterrar aqui."
A cunhada Beatriz arranjou o dinheiro e ela, de menino empacotado e aconchegado nos braços, se mandou num ônibus da linha pra Campina Grande, a velha "capital do interior". Destino: casa dos irmãos e irmãs, todos sapateiros, ali entre as ruas Chile e Paraná, entre Monte Castelo e Nova Brasília.
De pronto levaram o menino a um farmacêutico famoso no bairro, Mamede Moisés Raia, que aplicou injeção e prescreveu outros remédios e cuidados.
Quinze dias depois Dona Neide retorna a Juazeirinho com o menino nos braços, desta feita, não mais às portas da morte, mas parrudinho e esperto. Tudo vira festa!
O menino mantém até hoje umas olheiras meio hereditárias e um pouco daquele olhar meio desolado, de quem quase se despede da vida sem vontade e sem dela entender muito, mas cresceu saudável e está aqui contando a história.
A bem da verdade, essa não é a história do menino, mas a história de Dona Neide, uma dessas anônimas heroínas brasileiras, capazes de dar à luz duas vezes a um mesmo ser.
4 comentários:
Que ótima história pra um domingo de Páscoa! As ações das muitas Neides do Brasil vêm mantendo vivas nossas crianças e são também elas, as Neides, que asseguram, a duras penas, a permanência das crianças na escola.
Lindo Rangel!!! Viva as Neides deste Brasil!!!!
Quem lutou contra a morte e venceu é porque já veio talhado guerreiro. Não oponente que intimide um batalhador desse.
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